quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Uma quarentona de costas largas

Quem nunca assistiu a um programa de TV relacionado à Internet, possivelmente passou os últimos anos escondido em algum lugar longínquo, fora do Sistema Solar.


Mais fácil que encontrar um conhecido na Calçada da Fama, é encontrar pessoas debatendo sobre “A Internet e o Jovem”, “Os males da Internet”, “Pedofilia na Internet”, seja nas TVs locais, nacionais, internacionais, nas revistas, jornais e até – por que não? – na própria Internet.


Na grande maioria desses debates, coloca-se em xeque se a Internet faz bem ou mal, quanto tempo deve-se dedicar a ela, o quanto se deve saber, se um ou outro gosta ou desgosta de usar seus recursos. Mas, afinal, quem é “A Internet”? De onde veio exatamente esse “ente universal”, tão sabido, temido, respeitado ou minimizado por “debatedores” de todo o mundo?

Desde que existe sociedade, existe necessidade de comunicação. Assobio, tambor, código Morse, telégrafo, rádio, TV e telefone foram ferramentas criadas ao longo do tempo para tentar resolver essa questão. Até que um dia, um sujeito esticou um cabo de cinco metros entre um computador e outro, e transmitiu um “olá” para o colega de Universidade. Ninguém deu muita atenção ao experimento – um telefone de fio feito com embalagens de iogurte poderia parecer mais eficiente. Estava criada aí a Internet.

O tempo passou, a tecnologia evoluiu, e surgiu a mais democrática, ampla e irrestrita ferramenta de comunicação já inventada: a Internet. Por R$ 2,00, qualquer um pode entrar numa lan house e criar para si um blog como este que você está lendo, e escrever o que lhe vier à mente. Ou, se não gosta de escrever, pode ler informações escritas por jornalistas e por pessoas comuns, iguais a ela, de todo o mundo...

Mas nem todas as pessoas estão interessadas na crise internacional. Existem os que querem falar com a namorada, os que querem mostrar fotos para os amigos, os que querem dar golpes, os que vendem e compram material de pedofilia, os que só queriam não querer coisa alguma. Enfim, existe uma sociedade inteira, com pessoas boas e más, felizes e tristes, por aí, com a primitiva e incansável vontade de se comunicar, de ter seu espaço. E, assim como os liquidificadores e as televisões, essas pessoas usam a Internet.

A Internet não é boa ou ruim, é apenas uma poderosíssima ferramenta – utilizada pela sociedade. Quem digitaliza o que está na Internet são pessoas, como eu e você, não são máquinas, não é a própria “Internet”. Computador não dá opinião, não é pedófilo e não dá golpe. A pessoas é que fazem isso. E muito antes da Internet ser inventada.

Os jovens sempre gostaram de jogar conversa fora. A princípio, sentavam na calçada e conversavam – e os pais reclamavam, porque estavam fora até tarde. Depois, passaram a conversar pelo telefone – e os pais reclamavam. Agora, conversam pelo MSN, e, adivinhem só, os pais estão reclamando. Pais preocupados e jovens revoltados fazem parte da vida, e não só da Internet.

Os estudantes sempre foram preguiçosos. Antes, copiavam o dever de casa do colega, antes da aula. Agora, copiam de um outro colega que mora lá no nordeste, pela Internet. A dificuldade dos professores em chamar a atenção dos alunos para um conteúdo muitas vezes desatualizado e desinteressante sempre fez, e continua fazendo, parte da profissão dos mestres.

Os golpistas continuam tentando dar golpes, e continuarão dando golpes em pessoas ingênuas, principalmente nas que se acham muito espertas. Faziam isso na porta da lotérica. Agora, fazem isso na porta da lotérica e pela Internet. Ninguém nunca culpou a porta da lotérica por ter sido vítima de ‘golpe do bilhete’.

Problemas mentais existem desde antes do primeiro psiquiatra resolver estudá-los. Suicidas se matam, psicopatas atiram, pedófilos buscam crianças. Na época de “Lolita”, eles iam aos parquinhos olhar. Agora, olham através da Internet.

É fácil discutir “A Internet” – ela não é gente, não é grupo social, não sou eu, não é você. Difícil e delicado é discutir a minha ignorância, as suas manias, os problemas do vizinho, a incompetência da cunhada em criar os filhos... Quebramos a parede, colocamos a culpa no martelo, simples assim. Mantêm-se assim o status, a tranquilidade, a mesma forma de agir e pensar de eras passadas e o clima “atual-sem assunto” dos programas de debate. Enquanto a Internet, coitada, vai pagando o ‘pato’ e aos poucos virando uma quarentona de costas largas, muito largas.